Marcelo Tas: Intercept se ancorou no ‘Método João Kleber’
Marcelo Tas topou estrear a coluna de entrevistas do novo formato de 'O Comentarista'.
MARCELO TAS – Na televisão atual, a ousadia faz muita falta. O CQC inovou em duas frentes aparentemente antagônicas: humor e jornalismo. Não é fácil misturar bem os dois ingredientes. Se a dosagem não for precisa, o caldo entorna. Costumo dizer que, quando a realidade é torta, a lente igualmente torta do humor tem chance de traduzir com mais fidelidade o absurdo que está diante dos olhos.
Só que eu não tenho apetite por refazer algo que já fiz. Desejo boa sorte aos interessados e sugiro coragem para juntar talentos e dar autonomia para a tarefa.
O CQC encerrou em 2015. Não cobriu o impeachment de Dilma, em 2016. Como teria sido? Marcelo Tas topou estrear a coluna de entrevistas do novo formato de O Comentarista. Com exclusividade, o apresentador do ‘Provocações’, da TV Cultura, fala sobre a mistura de humor com jornalismo, critica o ministro da Educação, minimiza o papel do CQC nas eleições recentes, e desenvolve sua visão sobre o que chama de “método João Kleber” de jornalismo. O COMENTARISTA – Você já disse que o CQC não funcionaria hoje em dia, por causa de quadros como o ‘Top Five’, que hoje envelheceriam rápido em uma semana. Mas o CQC faz falta hoje? Poderia funcionar se fosse diário?MARCELO TAS – Na televisão atual, a ousadia faz muita falta. O CQC inovou em duas frentes aparentemente antagônicas: humor e jornalismo. Não é fácil misturar bem os dois ingredientes. Se a dosagem não for precisa, o caldo entorna. Costumo dizer que, quando a realidade é torta, a lente igualmente torta do humor tem chance de traduzir com mais fidelidade o absurdo que está diante dos olhos.
Só que eu não tenho apetite por refazer algo que já fiz. Desejo boa sorte aos interessados e sugiro coragem para juntar talentos e dar autonomia para a tarefa.
O CQC encerrou em 2015. Não cobriu o impeachment de Dilma, em 2016. Como teria sido?Apesar de astrólogos de YouTube estarem na moda, não sou adepto de fazer previsões. Só tenho uma certeza: seríamos acusados de petistas e, ao mesmo tempo, de coxinhas pelos zumbis da bipolaridade. Como fomos, aliás, por toda existência do CQC. Nunca conseguiram nos colocar numa caixinha. Esta é a melhor medalha que um programa de humor pode receber. Ser amado e odiado por todas as correntes ideológicas.
Na busca pelo furo, vale tudo – custe o que custar? Mensagens roubadas, por exemplo…
O furo ainda desperta imensa fantasia nos jornalistas. Só que com o advento do smartphone, o furo morreu e nem virou manchete.
Quase sempre, a primeira imagem ou relato de um fato relevante não é feito por um jornalista, mas por um mero mortal, um pedestre que captura a cena. Isto não anula o jornalista; pelo contrário, aumenta a responsabilidade dele diante da revolução digital.
A tarefa primordial do jornalista agora é fazer a curadoria e dar contexto à avalanche de dados.
Se, na pergunta, você insinua as supostas mensagens da Lava Jato vazadas pelo The Intercept, não fujo da resposta. Não me parecem mensagens roubadas, mas recebidas e publicadas sem contexto.
Vejo no episódio uma ausência clara da função primordial do jornalismo. Os dados não foram tratados com transparência e contexto. Pelo contrário, há nitidamente um viés manipulador, ativista e militante que utiliza técnicas de chamar atenção usando iscas cuidadosamente colocadas no anzol das manchetes. É o manjado caça-clique.
A técnica é ancorada numa espécie de Método João Kleber de Jornalismo que se resume em criar suspense por algo que está por vir e nunca vem. O material chegou a ser anunciado com potencial de fôlego para “um ano”, como nas séries da Netflix. O objetivo claro, ao invés de debater e processar os fatos de forma imparcial ou pelo menos com pluralidade de visões, é manter uma falsa tensão de relevância no ar.
É mais um case de marketing do que de jornalismo. Marcelo Tas
Se o site não tinha musculatura jornalística para processar os dados, por que não compartilhou a tarefa desde o início com outros jornalistas ou veículos? Loucura pelo furo, vaidade, paixão política ou uma combinação dos três certamente atrapalharam o trabalho jornalístico. Tudo isso parece ter ofuscado a revelação de eventuais fatos relevantes que poderiam estar contidos no vazamento.
É importante registrar que sou um incansável defensor da liberdade de imprensa. Numa reportagem que pretende ter essa envergadura, a função do jornalista é exigida no seu limite: a informação deve ser publicada de forma transparente, completa e contextualizada.
O que vi até agora foi uma publicação em conta-gotas, com um grau de enviesamento que prejudica a compreensão dos fatos. É mais um case de marketing do que de jornalismo.
Qual seria o desempenho de Abraham Weintraub como repórter do CQC?
É lamentável alguém com um intelecto tão raquítico ser o responsável pelo Ministério da Educação do Brasil. Tudo que este rapaz conseguiu até agora foi produzir pataquadas e piadolas sem graça. É um zero à esquerda. Com certeza, Weintraub não passaria num teste para repórter do CQC. Não tem carisma, inteligência, nem um pingo de graça. Triste figura. O presidente errou pela segunda vez. Acorda, Bolsonaro!
Bolsonaro hoje é presidente, e Alexandre Frota é deputado. Que outras figurinhas frequentes do CQC estarão em ascensão no futuro?
O CQC expôs a realidade brasileira de forma inédita na TV que na época vivia em período de caretice e sonolência. O CQC, sobretudo, deu voz à diversidade. De Caetano Veloso a Tiririca, de Anitta a Pedro Almodóvar, de Renan Calheiros a Angela Merkel… Todo mundo passou pelo microfone do CQC, do Diogo Mainardi até o super gênio recluso João Gilberto.
O CQC, como você mesmo notou, acabou em 2015. Se, anos depois, fomos os responsáveis pela eleição de Bolsonaro, é porque somos paranormais, super poderosos e extremamente relevantes. Neste caso, concordo, agradeço e aceito o elogio.
Quem você sonha entrevistar no Provocações e qual seria a primeira pergunta?
Dalila, a amante de Sansão: esse negócio de que a força de um homem está nos cabelos… É fake news?
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