Quadrilha pagava R$ 5 mil para difamar rivais políticos em locais públicos
Esquema de fake news em filas de banco e padarias influenciou eleições municipais no Rio e lembra táticas russas para desestabilizar democracias
Uma organização criminosa foi desarticulada nesta quinta-feira, 14, pela Polícia Federal, por promover um esquema de desinformação que envolvia o pagamento de R$ 5 mil para agentes que difamavam adversários políticos em locais de grande circulação, como filas de bancos e padarias.
O grupo, ativo desde 2016, já interferiu em três eleições municipais no estado do Rio de Janeiro, atingindo 13 cidades. Os envolvidos contratavam pessoas para disseminar fake news presencialmente, uma estratégia que, segundo especialistas, é mais difícil de rastrear do que as tradicionais campanhas digitais.
As investigações revelaram que os propagadores de fake news precisavam prestar contas diariamente, relatando o número de eleitores abordados, quantos apoiavam o candidato-alvo e o número de votantes que supostamente mudaram de opinião em favor do político financiador do esquema.
O grupo criava um cenário de manipulação invisível, onde os eleitores acreditavam estar recebendo informações legítimas em conversas casuais do dia a dia.
Esquema complexo e táticas russas
O coordenador da operação, delegado Cláudio Monteiro, destacou a gravidade da situação, afirmando que “essa prática é uma ameaça direta à democracia, pois influencia o eleitor a partir de mentiras, fazendo com que ele aja contra sua própria vontade nas urnas”.
Essa tática, que se aproveita do ambiente físico e não digital para espalhar desinformação, deixa menos rastros e é mais difícil de ser desmantelada.
O método de infiltração em locais públicos é semelhante às táticas adotadas pela Rússia para desestabilizar democracias inimigas. O Kremlin tem histórico de coordenar campanhas de desinformação que exploram divisões sociais e amplificam debates polarizadores, frequentemente usando contatos locais para espalhar fake news.
No Brasil, o objetivo é minar a confiança no processo eleitoral e promover candidatos alinhados com interesses particulares, corroendo a integridade das eleições e da própria democracia.
A disseminação de fake news em locais públicos, sem registros digitais, também complica a ação das autoridades e prolonga a duração do esquema. Segundo especialistas, essa abordagem pode se tornar mais comum nas próximas eleições, já que é uma forma eficaz de manipular a opinião pública e polarizar o debate eleitoral.
Prisões e desdobramentos
Quatro suspeitos foram presos preventivamente na Operação Teatro Invisível, incluindo Bernard Rodrigues Soares, presidente municipal do União Brasil em São João de Meriti, e ex-secretário de Comunicação da cidade.
A Justiça bloqueou R$ 1 milhão em bens de cada investigado. Além disso, a PF apreendeu R$ 188 mil em dinheiro vivo, veículos de luxo e dispositivos eletrônicos durante o cumprimento dos mandados de busca e apreensão.
Entre as cidades afetadas pelo esquema estão Araruama, Belford Roxo, Cabo Frio, Mangaratiba, São João de Meriti e Itaguaí. As investigações também indicam que alguns dos coordenadores envolvidos deixavam temporariamente seus cargos públicos durante as eleições, utilizando funcionários fantasmas para substituir suas funções.
A operação revelou uma crescente profissionalização da desinformação no Brasil, com estruturas organizadas, metas diárias e remuneração fixa para os envolvidos. Isso pode ter um impacto ainda mais devastador nas eleições municipais, onde o contato direto com os eleitores é decisivo e o nível de escrutínio da mídia nacional é menor.
A proliferação de desinformação organizada, combinada com a dificuldade de monitorar esse tipo de atividade, pode tornar a interferência nas eleições locais uma prática mais sofisticada e perigosa.
Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.
Comentários (0)