Marçal põe à prova sua medalha de “imbrochável”
O constrangimento imposto por Pablo Marçal à família Bolsonaro é ser bolsonarista demais, mais até do que o próprio Jair está se permitindo nesta campanha municipal
O prefeito Ricardo Nunes (MDB) tem o apoio declarado de Jair Bolsonaro na tentativa de se reeleger em São Paulo. Até ganhou uma medalha de “imbrochável”, “imorrível” e “incomível” (foto). Mas as palavras usadas pelo ex-presidente ao entregar a condecoração a Nunes não foram exatamente essas, e isso dá a dimensão da distância entre o prefeito e seu desafiante Pablo Marçal (PRTB), que recebeu a honra ao mérito bolsonarista antes dele.
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Quando entregou a medalha a Nunes, o ex-presidente substituiu dois dos três “is” do “Clube do Bolsonaro”. Sobrou apenas o “imorrível” da condecoração original. As outras duas palavras, mais vulgares, foram substituídas por “insubstituível” e “inigualável”.
Marçal não impõe esse tipo de constrangimento ao ex-presidente, mas outro: hoje, o ex-coach é bolsonarista até demais, mais até do que o próprio Bolsonaro e sua família estão se permitindo nesta campanha municipal.
Após o candidato do PRTB monopolizar as atenções nos primeiros debates de São Paulo e aparecer subindo em pesquisa, o ex-presidente Jair e o deputado federal Eduardo (PL-SP) passaram a marcar posição contra Marçal — o vereador Carlos (PL-RJ) já tinha rebatido o antigo aliado nas redes sociais, por críticas pela sua atuação na campanha do pai em 2022.
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Valdemar Costa Neto
Em suas respostas públicas, Marçal toma o cuidado de não confrontar a essência do bolsonarismo, e principalmente a figura do patriarca, que ele defende como futuro presidente da República. O candidato à Prefeitura de São Paulo faz o contrário: joga na cara dos antigos aliados que quem mudou não foi ele.
“Entendo sua palavra ao Valdemar Costa Neto, mas a honra e a gratidão são frutos de um homem sensato”, disse Marçal em resposta à mensagem em que o perfil de Bolsonaro no Instagram pôs em questão se existia um “nós” entre os dois. Quer dizer, o Bolsonaro que não se curvava aos conchavos partidários (pelo menos no discurso) ficou para trás, e ele próprio admitiu isso ao lamentar que Nunes não é seu candidato dos sonhos, dando início aos embates púbicos que se seguiram.
O nome do presidente nacional do PL, responsável por costurar o apoio pela reeleição de Nunes e pela ambiciosa meta de conquistar mais de mil prefeituras Brasil afora, apareceu em outra mensagem de Marçal, desta vez dirigida a Eduardo Bolsonaro no X: “O Valdemar Costa Neto não representa o anseio dos conservadores de São Paulo. Você será o nosso Senador por São Paulo. Pra cima irmão”, escreveu o ex-coach.
Redes suspensas
Nesse contexto, a suspensão das redes sociais de Marçal se presta perfeitamente ao discurso de rejeitado pelo sistema. O fato de ele estar possivelmente burlando as regras eleitorais, ao se beneficiar de uma rede de distribuidores de conteúdo remunerada e não declarada, segundo alegação considerada pelo Ministério Público Eleitoral, virou um detalhe na corrida por votos.
Os eleitores de Marçal tentam rotular como censora a deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP), cujo partido questionou formalmente a estratégia de comunicação do ex-coach. É uma clara e conveniente reação à adversária que chegou mais perto de machucar o grande destaque da campanha até agora, ao associá-lo ao PCC usando métodos do próprio Marçal.
Por enquanto, o ex-coach se esquiva de Tabata, sem confronto direto, tratando a adversária como irrelevante, a partir do que indicam as pesquisas de intenção de voto. E o fato é que, de um dia para o outro, seu perfil alternativo no Instagram reuniu dois milhões de seguidores, desmoralizando a determinação da Justiça eleitoral.
Quem é mais bolsonarista?
Uma análise publicada por Yuri Sanches, chefe de Risco Político da AtlasIntel, instituto que registrou primeiro a influência dos debates protagonizados por Marçal nas intenções de voto da capital paulista, traduz em números o tamanho do buraco no qual a família Bolsonaro se meteu com a candidatura de Marçal:
“Na pesquisa Atlas de 08/08, Nunes tinha 55% do eleitorado de Bolsonaro em São Paulo em 2022, enquanto Marçal tinha 25%. Hoje, Marçal vira o jogo: conquista 42% do eleitorado bolsonarista e Nunes caiu para 39%. Está em jogo a influência política de Bolsonaro sobre sua própria base.”
A pesquisa Datafolha que confirmou a ascensão de Marçal captou o mesmo fenômeno. O ex-coach passou de 18% para 30% nas intenções de voto dos evangélicos, enquanto Nunes recuou de 26% para 22%. Entre os eleitores de Bolsonaro em 2022, o salto de Marçal foi de 25% para 46%.
As próximas pesquisas apontarão a relevância dos atritos públicos entre Marçal e os Bolsonaro para esta eleição. É difícil imaginar que a criatura ganhará esse embate contra o criador, mas já está evidente que a família do ex-presidente sairá politicamente ferida desta campanha, e em sua essência.
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