Em evento com Lula, Haddad é alvo de protesto por despejos da SPDA
Manifestantes reclamam dos “graves” efeitos de decisão de 2016 do então prefeito de SP e ilustram revolta da suposta base com a realidade petista
Passou despercebido na imprensa, mas o evento do governo Lula na zona leste de São Paulo, na manhã de sábado, 29 de junho, com as participações do presidente da República e do seu pré-candidato à Prefeitura da capital paulista, Guilherme Boulos, teve protesto contra o ex-prefeito e atual ministro da Fazenda, Fernando Haddad (foto), também presente.
“Você autorizou a venda da Cohab para a SPDA em 2016! A SPDA está tomando nossas casas!”, gritou, por exemplo, um manifestante, quando Haddad assumiu o microfone.
“É verdade!”, endossou outra.
O grupo em torno dos dois levou e ergueu cartazes, nos quais se liam dizeres como “Fora SPDA!”, “Proteção aos mutuários da Cohab”, “Queremos solução”, “Revogação da cessão de créditos da SPDA!”.
Diante do transtorno no evento do governo que serviu de palanque para Boulos, Lula precisou intervir em socorro a Haddad:
“Eu não sei o que é. O que eu proponho é o seguinte: que vocês me esperem aqui (…) pra gente saber (…)”, disse o presidente, do palco, em meio aos gritos na plateia.
Qual foi a decisão de Haddad envolvendo Cohab-SP e SPDA?
Conforme o Diário Oficial de 12 de abril de 2016, último ano da gestão municipal de Haddad, a Prefeitura cedeu à Companhia São Paulo de Desenvolvimento e Mobilização de Ativos (SPDA) “a Carteira de Crédito Imobiliário, registrada em balanço patrimonial consolidado do Município de São Paulo, em 16 de fevereiro de 2016, pelo valor de R$ 1.057.229.289,91 (um bilhão, cinquenta e sete milhões, duzentos e vinte e nove mil, duzentos e oitenta e nove reais e noventa e um centavos), para fins de futuro aumento de capital da SPDA”.
Segundo o contrato, “entende-se como ‘Carteira de Crédito Imobiliário’ os créditos transferidos à PREFEITURA pela COHAB-SP” com base em uma série de dispositivos legais.
O vídeo do protesto contra Haddad
O Portal Cidade Tiradentes publicou no Instagram o vídeo do protesto dos “moradores que têm imóveis em Cidade Tiradentes e estão em processo de despejo pela SPDA, empresa [para] que na época o então Prefeito Fernando Haddad passou centenas de imóveis”.
“Moradores pedem ajuda para que este problema seja solucionado e hoje [sábado] no ato do presidente alguns moradores cobraram então o Fernando Haddad que hoje é ministro de Lula. Qual a sua opinião?”
Qual é o movimento por trás do protesto contra despejos em São Paulo?
Os manifestantes representaram o “Movimento Reaja: Sem Leilão, Sem Despejo, Moradia é um Direito!”, que assumiu no Instagram a responsabilidade pela ação de “confrontar” o ministro.
“Um de nossos integrantes lembrou que, em 2016, ele assinou a cessão de créditos da COHAB à SPDA, impactando milhares de famílias que agora enfrentam a perda de seus imóveis.”
A ação foi chamada de “grito de desespero”.
“Pedimos socorro ao governo federal para ajudar essas pessoas. Só em Cidade Tiradentes, 500 famílias estão sendo despejadas, e 8 mil em toda a cidade.
As consequências da cessão de créditos à SPDA são graves: compromissos de compra e venda foram alterados para contratos de alienação fiduciária. Após 120 dias de atraso, os imóveis vão a leilão extrajudicialmente. Os moradores são surpreendidos e não conseguem negociar, pois as parcelas são triplicadas e os valores podem chegar a 20, 30, até 80 mil reais à vista, sem a possibilidade de parcelamento.”
Movimento Reaja diz não querer atacar PT, mas reivindicar direitos
Já no domingo, 30, o “Movimento Reaja” publicou uma nota em outro tom, buscando distensionar a relação com o governo do PT:
“Prezados companheiros e companheiras,
Fomos informados sobre a circulação de um vídeo referente à manifestação de um de nossos integrantes durante a inauguração da UNIFESP Itaquera.
Gostaríamos de esclarecer que o nosso movimento não tem posicionamento partidário. A manifestação do integrante em questão não teve como objetivo atacar membros do Partido dos Trabalhadores (PT), mas sim reivindicar direitos.
O ato foi uma expressão de desespero, visando conscientizar os líderes do Poder Executivo, assim como a Secretária da Habitação, que estava presente no evento.
Pedimos desculpas a todos os companheiros e companheiras que se sentiram ofendidos pela edição do vídeo que circula fora de contexto.
Sem mais, Movimento Reaja: Sem Leilão, Sem Despejo, Moradia é um Direito!”.
Presidente da Cohab-SP rebateu fake news petista sobre tomada de imóveis
Em 2 de fevereiro, quatro meses antes do protesto, o presidente da Cohab-SP, João Cury Neto (MDB), nomeado pelo atual prefeito da capital paulista, seu correligionário Ricardo Nunes, publicou vídeo para refutar como “fake news” a tentativa de atribuir ao órgão a culpa pelas cobranças feitas pela SPDA e pelos consequentes processos de despejo.
Haddad “pegou uma parte da carteira da Cohab, dos créditos da Cohab, desses contratos que foram feitos com vocês, e vendeu isso pra uma empresa, pra essa empresa cobrar vocês”.
“E depois o que aconteceu? A empresa começou a cobrar. E agora as pessoas acham que é a Cohab. Não é a Cohab que tá cobrando vocês. É essa empresa que foi contratada lá na gestão do PT”, disse Cury, ex-prefeito de Botucatu, exibindo o documento da cessão.
“Então isso é maldade, isso é má-fé. Isso já é campanha política, eleitoral, que estão fazendo em cima das pessoas mais carentes. A Cohab é o contrário disso. Da nossa carteira, nós estamos soltando programa de renegociação de dívida. A gente dá desconto para aquela pessoa que durante a pandemia teve problema, para quem ficou desempregado, para quem teve algum desarranjo financeiro na família. A gente tem que ajudar. Foi isso que o prefeito Ricardo Nunes falou para nós desde o dia em que eu entrei aqui”, completou o presidente da Cohab-SP, relatando descontos de até 70%.
O Antagonista vem registrando as dificuldades dos governos do PT de lidar com revoltas dentro de sua alegada base ideológica e sindical, em razão do contraste entre suas promessas publicitárias de campanha e os resultados insatisfatórios de suas decisões no poder.
Neste ponto, as gestões de Haddad e Lula têm muito em comum, como se pode verificar em nossa série de matérias e análises abaixo:
Lula supera Bolsonaro (em greves)
Professores recusam proposta do governo Lula e mantêm greve
Sindicatos acusam governo Lula de tolher direito de greve
Após dois meses, Lula se reúne com reitores e cobra fim da greve da educação
Com professores, fica claro que o problema de Lula não é o marketing, é a realidade
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