Liberdade de imprensa está ameaçada no governo de Bukele
Jornalistas e organismos internacionais denunciam ameaças e possível repressão a críticos do governo

Jornalistas do veículo digital El Faro, de El Salvador, estão em alerta máximo e temem ser presos após publicarem entrevistas detalhando supostos acordos entre o governo de Nayib Bukele e gangues criminosas. O diretor e fundador do jornal, Carlos Dada, revelou no Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, ter recebido informações confiáveis de que a procuradoria da República estaria preparando ordens de prisão contra pelo menos sete membros da equipe.
A tensão aumentou após a publicação, em 1º de maio, de entrevistas com Carlos Cartagena (“Charlie”) e “Liro Man”, ex-líderes da facção Barrio 18 Revolucionarios. Nos depoimentos, eles detalham supostos pactos com o “bukelismo” que, segundo reportagem da LatAm Journalism Review, teriam contribuído para a construção do poder político do atual presidente, remontando à época em que ele era prefeito de San Salvador.
Cartagena, que hoje é procurado pelo governo, afirmou que a gangue foi orientada a pedir votos para Bukele nas eleições para prefeito e na primeira candidatura à presidência, em 2019. Segundo Dada, as ordens de prisão seriam a única saída encontrada pelo governo para silenciar o jornal, que alega possuir “abundância de provas”.
Contexto e reação do governo
As suspeitas sobre acordos entre Bukele e gangues não são novas, e o próprio El Faro já havia publicado reportagens anteriores sobre o tema.
Após a publicação das entrevistas, o governo salvadorenho teria iniciado uma campanha coordenada contra os jornalistas do periódico. Peter Dumas, diretor do Organismo de Inteligência do Estado, atacou o veículo nas redes sociais, acusando-o de cumplicidade com o crime e pedindo mais orçamento para espionagem.
O presidente Nayib Bukele, por sua vez, questionou publicamente o trabalho de ONGs e meios de comunicação que, segundo ele, não consideram lucrativo um país pacificado. Em contraste, o comissionado presidencial de Direitos Humanos e Liberdade de Expressão, Andrés Guzmán, afirmou que a liberdade de imprensa é respeitada e garantida no país, desde que os jornalistas ajam dentro da lei. Paralelamente, o El Faro tem sido alvo de ataques coordenados por usuários de redes sociais, que argumentam que dar voz a um criminoso procurado seria um delito.
Carlos Dada ressalta que, ao longo de 27 anos, o El Faro entrevistou diversas figuras envolvidas em crimes para revelar verdades de interesse público, como crimes de guerra e rotas do narcotráfico. Óscar Martínez, chefe de redação, reforça que o papel do jornalismo é fornecer informações aos cidadãos.
Um Estado seguro ou um estado de exceção?
A situação ocorre em um contexto onde El Salvador vive sob estado de exceção permanente desde março de 2022, com o governo adotando métodos repressivos no combate ao crime que, embora populares, geram denúncias de desrespeito a direitos humanos e devido processo legal.
O presidente Bukele consolidou um poder sem pesos e contrapesos significativos, controlando os poderes Legislativo e Judiciário, o que torna a imprensa uma das poucas vozes críticas. Desde 2023, o El Faro opera sua parte administrativa a partir da Costa Rica devido a assédio judicial e à descoberta de que seus jornalistas foram espionados com software Pegasus.
Entidades internacionais e regionais, como a Sociedade Interamericana de Imprensa, o Human Rights Watch e a Associação de Jornalistas de El Salvador (Apes), assim como o relator especial para a Liberdade de Expressão da CIDH, Pedro Vaca, manifestaram apoio ao El Faro e condenaram a possibilidade de prisões.
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