Pep Guardiola, visto como o maior técnico da história do futebol, enfrenta um período inédito de dificuldades que vai além dos resultados em campo. Em artigo publicado no The Telegraph nesta sexta, 29, Jamie Carragher reflete sobre a crise que humaniza o gênio espanhol e discute como ele tenta superar um momento que combina dúvidas táticas e pessoais.

O Manchester City, sob o comando de Guardiola, está sem vencer há seis jogos, incluindo uma série de cinco derrotas consecutivas e um empate doloroso contra o Feyenoord pela Champions League. Após ver seu time abrir 3 a 0 e levar o empate com gols nos minutos finais, Guardiola deu uma entrevista pós-jogo marcada por um incidente incomum: ele apareceu com marcas no rosto, explicando que as fez ao arranhar-se com a unha.

Essa série negativa nunca havia ocorrido em sua carreira. Os problemas da equipe incluem uma onda de lesões que desconfigurou o time titular, especialmente na defesa, além da ausência crucial de Rodri no meio-campo. Guardiola já admitiu que, pelos padrões do clube, esta será uma temporada ruim, mas pediu paciência à torcida e à imprensa. Apesar das dificuldades, o treinador renovou seu contrato com o City até 2027.

Guardiola usou as redes sociais para tratar o tema com seriedade, pedindo desculpas por sua brincadeira inicial. “Sei que muitas pessoas enfrentam problemas de saúde mental todos os dias e gostaria de aproveitar este momento para destacar uma das formas pelas quais as pessoas podem buscar ajuda”, escreveu. Ele ainda forneceu informações sobre serviços de apoio em casos de sofrimento emocional.

O maior técnico de todos os tempos

Carragher enaltece a trajetória que faz de Guardiola o maior técnico da era moderna. Seu Barcelona (2008-2012) não apenas dominou o futebol mundial, mas moldou um estilo de jogo que virou referência global.

O tiki-taka, com seu controle obsessivo de posse e movimentação coordenada, foi levado à perfeição com jogadores como Lionel Messi, Xavi e Iniesta. “Sob Guardiola, o Barcelona tornou-se o maior time que já vimos”, afirma o autor.

Além disso, Guardiola introduziu táticas revolucionárias que transcendem gerações: o falso nove, que transformou Messi em um organizador e finalizador; laterais que avançam para o meio-campo; e zagueiros que atuam como construtores de jogo. No Bayern de Munique e no Manchester City, ele continuou inovando, combinando perfeição técnica e intensidade física.

No entanto, a sequência recente de resultados negativos expõe uma face rara do técnico: a dúvida. “Guardiola parecia imune às crises que marcaram as carreiras de outros grandes técnicos, como José Mourinho, Carlo Ancelotti e Jürgen Klopp”, escreve Carragher, destacando que o atual momento do City trouxe Guardiola para um território desconhecido.

Crise tática e emocional

A ausência de Rodri, peça-chave no esquema do City, é apontada como um dos fatores da queda. “Sem ele, Guardiola depende de veteranos como Ilkay Gundogan e Mateo Kovacic, que já não têm o fôlego necessário para sustentar o sistema”, observa Carragher. A vulnerabilidade do City, segundo o autor, lembra a queda do Liverpool na temporada 2020-21, quando a lesão de Virgil van Dijk abalou o time de Klopp.

Porém, Carragher acredita que a atual pressão vai além do campo. Os comentários recentes de Guardiola sobre automutilação e saúde mental ilustram o peso emocional que ele carrega durante esta fase. Isso humaniza o técnico, que sempre foi visto como uma figura infalível, e mostra como ele está lidando com os mesmos desafios enfrentados por tantos outros, dentro e fora do futebol.

Para Carragher, o compromisso de Guardiola com o futuro do City é uma prova de sua grandeza. “Guardiola poderia ter saído neste ano, com seu legado intacto. Mas escolheu liderar a reconstrução do clube, garantindo que sua obra permaneça sólida para o futuro”, escreve.

Se conseguir reverter a temporada e conquistar mais um título, será, segundo o autor, “seu triunfo mais humano – transformar vulnerabilidade em força”.

Quem é Jamie Carragher

Jamie Carragher, britânico, é ex-jogador e comentarista de futebol. Atuou como zagueiro no Liverpool entre 1996 e 2013, acumulando mais de 700 partidas e sendo uma das lendas do clube. Campeão da Liga dos Campeões em 2005, é conhecido por sua inteligência tática e análises precisas. Após a aposentadoria, tornou-se colunista do The Telegraph e comentarista da Sky Sports, onde se destaca pela profundidade de suas reflexões sobre o futebol.