O politicamente correto matou o humor?
Hoje vamos falar de um assunto delicado que mexe com todo mundo: o humor politicamente correto e a TV brasileira

Essa semana tivemos a notícia que o comediante Leo Lins foi condenado a mais de 8 anos de prisão por “praticar e incitar preconceito” em suas piadas. Isso, naturalmente, nos convida a analisar a trajetória do humor, sobretudo na TV, principal meio de dispersão dele, nos últimos anos.
Os anos 80 e 90 pareciam uma festa de risadas. Sai de Baixo fazia o Brasil rolar com Caco Antibes e suas tiradas. A Praça é Nossa falava de tudo, do caipira ao político, e TV Pirata e o Casseta & Planeta cutucavam sem dó.
Até o Pânico na TV, nos áureos tempos de RedeTV, fazia muito barulho e dava audiência. Diziam que era um humor solto, direto, como o “jeitão do brasileiro”. Mas desde então o jogo virou.
Os limites do humor passarem a ser discutidos e o politicamente correto chegou com novas regras, e muita gente acha que ele apagou o brilho da comédia. Outros dizem que ele trouxe mais equilíbrio e acabou com excessos, ofensas e ataques a grupos minoritários.
Mesmo sem exemplos extremos como o de Leo Lins, tem muita gente que sente saudade do dito “humor sem trava”. Naquela época, dizia-se que a TV falava com todo mundo – e ninguém pedia licença. Para muitos, a TV de hoje, parece acuada.
Bastaria uma piada sobre temas mais sensíveis, como religião (algumas, mais do que outras) ou gênero, e vira-se alvo de críticas nas redes sociais. Alguns humoristas celebram, outros, temem o “cancelamento”, e o resultado, seria um humor muito mais contido, que não provoca, não chacoalha.
Enquanto isso, no YouTube, canais como Porta dos Fundos dizem o que a TV evita, conquistando quem quer risadas com menos filtros. Mas alguns enxergam neles um viés tendencioso para um determinado espectro ideológico. Para esses, o politicamente correto é uma corrente que amarra a espontaneidade do riso.
Do outro lado, há quem veja o politicamente correto como um avanço necessário, irrevogável e até tardio. Nos anos 80, muitas piadas reforçavam estereótipos – negros, gays e mulheres eram alvos fáceis, e só quem não era desses grupos, riam. Até a histórica Praça é Nossa já foi criticada por isso.
Hoje, o humor e a TV brasileira tenta, timidamente, dar vazão a textos mais inclusivos, que não precisem ofender e estigmatizar para funcionar.
Programas como Tá no Ar, da Globo, que saiu do ar em 2019, tentaram mostrar que dá para ser criativo sem machucar, mas, uma vez mais, há os que achavam suas piadas muito sofisticadas e politizadas, agradando a um público específico, tanto que seus resultados de audiência eram apenas discretos.
Para esse grupo, o politicamente correto reflete um Brasil mais consciente, representativo, que cobra respeito. E a queda de audiência? Eles culpam da concorrência dos streamings, mudança de conceito do que é entretenimento e da falta de ideias novas, não só das novas regras. Muitos jovens, que também nos assistem, preferem esse cuidado.
Mas será que nessa tentativa de respeitar todo mundo, errou-se na dose? Claro, existem piadas que você ri da pessoa e piadas que você ri com a pessoa, e a arte de distinguir entre um e outro é sutil e às vezes pessoal, mas a ausência de piadas sobre um grupo, por medo de abordá-lo, não é, de alguma forma, silênciá-lo e marginalizá-lo?
Esse texto não pretende trazer uma resposta, dizendo que o caminho é este ou aquele, mas sim trazer os diferentes argumentos para o debate em torno desse tema, mais delicado do que parece, num momento em que, não por acaso, há pouquíssimos programas de humor no ar na TV aberta.
Com isso deixo aqui algumas perguntas para você pensar e, se quiser, responder nos comentários:
- O politicamente correto tirou a alma do humor ou trouxe uma nova forma de rir, sem ofender?
- A TV vai achar o meio do caminho, sem ficar pisando em ovos, mas também sem recorrer a esterótipos considerados ofensivos?
- Brincar com estereótipos prejudica as pessoas?
- Um comediante deve ir preso por contar piadas, por mais que você discorde delas?
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Comentários (3)
Marcia Elizabeth Brunetti
24.06.2025 14:47O politicamente correto tirou a alma do humor. Não tenho dúvidas. Já ouvi muitas piadas que, indiretamente, apontariam minhas falhas e meus defeitos, só consegui rir. Minha geração (baby boomers) teve a honra de conhecer comediantes como Jô Soares que brincava até com gordos, imagina?
Lucia Carlos Andrade e Freitas Santos
09.06.2025 04:321• O politicamente correto tirou a graça de tudo. Não se pode mais fazer comentário sem antes medir muito bem todas as palavras. Prejudicar mais ainda o humor é insuportável. 2• A TV vai continuar seu inexorável caminho para o fundo do poço. 3• Brincar com estereótipos só prejudica histérico mimizento. 4• Um comediante jamais poderia ser preso por fazer piadas no palco, ainda que elas sejam grosseiras, desagradáveis, desrespeitosas. Se não gostar, não aplauda; vá à bilheteria e cobre a devolução do ingresso, ou troque o canal. Ninguém o obriga a ver ou ouvir o que você não quer.
ALDO FERREIRA DE MORAES ARAUJO
05.06.2025 11:31Antigamente os programas de humor passavam num horário adequado para os trabalhadores e estudantes, começavam às 21 horas. Este último humorístico, "Tá No Ar" passava depois do BBB, quem estuda ou quem trabalha não tem como assistir. Hoje em dia seria impensável personagens como um Capitão Gay, do Jô Soares, ou um Haroldo, o hétero, do Chico Anysio. O humor na TV está sob sete palmos de terra e num caixão lacrado.