Márcio Coimbra na Crusoé: Triagem soberana
O Brasil precisa selecionar os investimentos estrangeiros com o objetivo de nos proteger de riscos, como o apagão em Portugal e Espanha

O colapso energético sem precedentes, que deixou milhões de pessoas no escuro em pelo menos doze países europeus, em especial Portugal e Espanha, ainda segue sem explicação.
O apagão, considerado o maior da última década, paralisou transportes, hospitais e redes de comunicação, além de causar prejuízos econômicos estimados em bilhões de euros.
As causas apontadas até o momento falam de um incêndio em uma subestação crítica na Alemanha, passando por um ataque cibernético e até um fenômeno atmosférico raro devido a variações extremas de temperatura no interior da Espanha.
Em suma, ninguém consegue apontar com exatidão o que pode ter acontecido.
Isso nos leva a um ponto que começa a ser discutido em várias nações e, recentemente, chegou até o Brasil.
Por necessidade de investimento, muitos países estão entregando partes significativas de suas infraestruturas para investidores internacionais, inclusive para países que confundem o conceito empresarial com uma espécie de capitalismo de Estado.
O resultado é que a infraestrutura de diversas nações hoje repousa sob domínio de países que possuem interesses e agenda próprios.
Em Portugal, a REN (Redes Energéticas Nacionais) é a empresa responsável pela gestão das redes de transporte de eletricidade e gás natural.
Funciona como operadora do sistema energético nacional, garantindo a segurança e eficiência do abastecimento de energia no país. Desde 2012, a China State Grid detém 25% de suas ações.
Na Espanha, epicentro do apagão, a Red Eléctrica de España, operadora do sistema elétrico nacional espanhol, tem 24,36% de suas ações repousando nas mãos da mesma China State Grid, que desde 2017 tornou-se a maior acionista privada da empresa.
Tanto em um caso como no outro, foram intensos os debates sobre a influência estrangeira em setores estratégicos.
O dinheiro chinês, entretanto, falou mais alto. Foram pagos 2,1 bilhões de euros pela Red Eléctrica de España em 2017 e 387 milhões de euros pela participação na Redes Energéticas Nacionais portuguesas em 2012.
Isso sem falar na EDP, que gera e distribui eletricidade (com forte presença da China Three Gorges) e na participação acionária chinesa na espanhola Iberdrola S.A.
No Brasil, a China State Grid controla cerca de 14% da rede de transmissão nacional, com o domínio de linhas no Norte e Nordeste e projetos no Centro-Oeste e Sudeste, sem contar com linhas de 1.500 km no Pará e Maranhão e parcerias com Furnas.
Desde 2017, também controla 54,64% da CPFL Energia, adquirida por 25,8 bilhões de reais, atuando em São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Paraná.
A China Three Gorges, com participação na Espanha e Portugal, adquiriu o controle de 14 hidrelétricas no Brasil, além de participação de outras três.
A empresa, que venceu o leilão de privatização da Cesp, é hoje a segunda maior geradora de energia com capital privado do país.
Por meio da EDP, a CTG também possui 11 parques eólicos no país.
Juntas, a State Grid, CTG, além da State Power Investiment Corporation (SPIC), controlam 15,6 mil MW, ou 10% de toda produção brasileira de energia.
Ambas as empresas são ainda fortes concorrentes em projetos de privatização, como os da Eletrobras e Cemig.
No intuito de evitar a sobrecarga de um país ou companhia em setores sensíveis, o Congresso brasileiro começou a se mobilizar com a proposta de criação do criação do Comitê de Triagem e Cooperação para Investimentos Estrangeiros Diretos.
O órgão ficaria responsável por avaliar e monitorar aportes estrangeiros em setores estratégicos da economia nacional, como já acontece nos Estados Unidos, Alemanha e China em áreas como energia, defesa e tecnologia.
A proposta equilibra abertura econômica e segurança nacional…
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