Brasileira revoluciona agricultura com biológicos e conquista o “Nobel”
Engenheira se destaca em trabalhos pioneiros que revolucionam a agricultura científica no Brasil

A engenheira agrônoma e pesquisadora brasileira Mariangela Hungria foi agraciada com o prestigiado Prêmio Mundial da Alimentação de 2025, amplamente reconhecido como o “Nobel da Agricultura”.
O anúncio ocorreu no dia 12 deste mês, na sede da World Food Prize Foundation em Des Moines, Iowa, Estados Unidos. A premiação celebra indivíduos que promovem melhorias na qualidade, quantidade ou disponibilidade global de alimentos.
O trabalho pioneiro de Mariangela Hungria em insumos biológicos, desenvolvido ao longo de mais de 40 anos na Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), revolucionou a agricultura no Brasil, impulsionando a produtividade, gerando economia bilionária para os agricultores e mitigando impactos ambientais.
Segundo Hungria, a persistência foi um diferencial crucial em sua trajetória, mantendo a crença no potencial dos biológicos como uma solução economicamente viável e de alto rendimento, mesmo quando muitos a desacreditavam.
Sua pesquisa deu origem a dezenas de tratamentos biológicos para sementes e solos que auxiliam as plantas na absorção de nutrientes através de microrganismos benéficos, como bactérias e fungos.
O impacto econômico e ambiental dos biológicos
Um dos focos centrais da pesquisa de Hungria são os inoculantes, produtos não químicos que contêm microrganismos benéficos. Ela foi uma das primeiras defensoras da fixação biológica de nitrogênio. Esse método utiliza bactérias fixadoras para converter nitrogênio do ar, que é abundante mas inacessível às plantas, em formas que elas podem absorver para crescer.
Mariangela Hungria explica que, sem esse processo natural, seria necessário usar fertilizantes químicos que demandam alta energia para produção (cerca de seis barris de petróleo por tonelada de nitrogênio) e são altamente poluentes, com cada quilo equivalente a 10 kg de CO₂ segundo o IPCC.
Seus estudos com bactérias como rhizobia, que interagem com raízes de leguminosas para fornecer nitrogênio em troca de energia, mostraram que a aplicação anual na soja via inoculante poderia aumentar a produtividade em até 8% em comparação com fertilizantes sintéticos. Posteriormente, ela foi a primeira a lançar cepas comerciais da bactéria Azospirillum brasilense. A combinação e aplicação de Azospirillum brasilense e rhizobia demonstrou a capacidade de dobrar o aumento da produtividade em feijão e soja.
Para Mariangela Hungria, o Brasil se tornou o maior produtor e exportador de soja do mundo em parte graças ao uso dessas bactérias, que tornam o cultivo economicamente viável.
A relevância dos insumos biológicos cresceu, especialmente com a guerra na Ucrânia e as sanções contra a Rússia, evidenciando a dependência brasileira de fertilizantes químicos importados (cerca de 85% do total utilizado). Essa conjuntura “escancarou nossa dependência… e abriu espaço para os biológicos”.
Embora o Brasil seja líder no uso de bioinsumos, eles ainda representam apenas 10% em relação aos químicos, e a pesquisadora defende mais investimento em pesquisa e indústria para diminuir essa dependência e avançar para uma agricultura mais sustentável.
Trajetória, reconhecimento e futuro
Com 43 anos dedicados à Embrapa, Mariangela Hungria é considerada a “mãe da microbiologia” no Brasil. Sua paixão pelo tema surgiu na infância, inspirada por sua avó, uma professora de ciências. Formada em Engenharia Agronômica pela ESALQ-USP, ela continuou seus estudos com mestrado, doutorado e pós-doutorado no Brasil, Estados Unidos e Espanha.
Autora de mais de 500 publicações, ela também criou o primeiro manual em português sobre métodos de microbiologia do solo adaptados aos trópicos. Recebeu a Ordem Nacional do Mérito Científico e é membro da Academia Brasileira de Ciências e da Academia Brasileira de Ciência Agronômica. Em março de 2025, foi homenageada com o Prêmio Mulheres e Ciência.
Mariangela Hungria aconselha jovens pesquisadoras a terem persistência, competência e apresentarem “resultados científicos robustos” para enfrentar o preconceito. A governadora de Iowa, Kim Reynolds, destacou Hungria como um exemplo inspirador para mulheres pesquisadoras.
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