Receita monitora até Pix do povo, mas Moraes já blindou esposas de ministros
O Antagonista

Receita monitora até Pix do povo, mas Moraes já blindou esposas de ministros

avatar
Felipe Moura Brasil
7 minutos de leitura 15.01.2025 14:16 comentários
Análise

Receita monitora até Pix do povo, mas Moraes já blindou esposas de ministros

Novos critérios de monitoramento só valem contra o cidadão comum?

avatar
Felipe Moura Brasil
7 minutos de leitura 15.01.2025 14:16 comentários 6
Receita monitora até Pix do povo, mas Moraes já blindou esposas de ministros
Foto: Bruno Peres/Agência Brasil

O que vale para qualquer cidadão comum vale também para as autoridades mais poderosas da República brasileira, e vice-versa?

Se a Receita Federal do Brasil, por exemplo, estabelece novos critérios de fiscalização, a fim de detectar eventuais casos de sonegação fiscal e fraude tributária, todos podem ser atingidos de igual maneira?

Com a entrada em vigor, em 1º de janeiro de 2025, dos novos critérios de monitoramento de transações financeiras de pessoas físicas e jurídicas, que haviam sido apresentados em setembro na Instrução Normativa RFB nº 2.219/24, convém lembrar o que aconteceu em 2019 na esteira dos então novos critérios de monitoramento de agentes públicos, que haviam sido apresentados nas 8 páginas da Nota Copes 48/2018 como “resultado de trabalho desenvolvido pela Equipe Especial de Programação de Combate a Fraudes Tributárias – EPP Fraude, instituída pela Portaria Copes n° 7, de 10 de março de 2017”.

Traduzindo: quando as esposas dos ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes, do STF, entraram na mira da Receita Federal em uma lista de 134 nomes, Alexandre de Moraes (foto) usou o inquérito multiuso das “fake news” para suspender a apuração do órgão e ainda dois auditores fiscais. O colega relator acusou genericamente, como de costume, “indícios de desvio de finalidade”, falta de “critérios objetivos de seleção” e pretensão de investigar diversos agentes públicos “de forma oblíqua e ilegal” tudo devidamente refutado, em seguida, em nota do Sindifisco Nacional e em carta aberta de 195 auditores da alta administração da Receita, com base nos documentos originais.

Refutação

“Para entrar na polêmica lista de 134 nomes, por exemplo, o contribuinte tinha que atender cumulativamente os seguintes critérios:

  • ser agente público;
  • possuir patrimônio familiar superior a 5 milhões de reais;
  • ter declarado possuir em espécie mais de 100 mil reais;
  • ter recebido em suas contas (ou de seu cônjuge) mais de 2,5 milhões de reais de lucros e/ou dividendos por participação societária em empresas;
  • e ter apresentado em sua declaração de rendimentos inconsistências graves com os dados declarados por tais empresas (omissão de valores, movimentação financeira incompatível, etc.).

Convenhamos, não são critérios triviais para um agente público”, resumiu o Sindifisco.

Outros trechos da nota merecem ser lembrados:

“Não interessa à sociedade uma Receita Federal que, enquanto demonstra rigor com as declarações de imposto de renda de pequenos contribuintes, passa ao largo dos radares das grandes movimentações financeiras.

Uma das iniciativas nessa direção foi justamente a criação de uma equipe especializada de seleção, que levantou diversos indícios de irregularidades tributárias em torno de agentes públicos, inclusive algumas Pessoas Politicamente Expostas.

Ao contrário do que insinuou Gilmar Mendes – sem apresentar, aliás, a mais ínfima prova – não se trata de um ‘bando’ ou ‘milícia institucional’ destinada a perseguir e ‘achacar’ alvos selecionados por suas predileções ideológicas ou por seu posicionamento crítico à Lava Jato.

Trata-se de um grupo técnico que seleciona contribuintes por parâmetros estritamente objetivos.

(…)

É incompreensível que Gilmar Mendes não se veja como um contribuinte comum, como qualquer outro brasileiro, suscetível de ter seu patrimônio e rendas verificados pela Receita Federal.

Afinal, qual o contribuinte que, ao receber uma intimação, convoca diretamente o secretário da Receita Federal para lhe dar explicações?

Segundo o próprio ministro, quando o IDP (empresa da qual é sócio) foi intimado, chamou Jorge Rachid ao seu gabinete. Este lhe teria dito que o Auditor-Fiscal responsável pelo procedimento era ligado à operação Calicute, e que isso já o deixara ‘advertido’.

Seria isso normal? O contribuinte ministro do STF provoca a presença do secretário da Receita Federal em razão de uma intimação recebida por sua empresa; o secretário da Receita comparece e lhe dá explicações, e ainda lhe passa uma informação sensível, advertindo-o que se tratava de um Auditor-Fiscal integrante de uma força-tarefa que investigava pessoas que, como mais tarde revelou a imprensa, possuíam vínculos com o ministro (como Jacob Barata, de cuja filha Gilmar foi padrinho de casamento).

Tratando-se de Gilmar Mendes, nada segue o rito convencional. Valendo-se da condição de ministro da mais alta corte do país, avisou, sem papas na língua, que pretende extinguir a área da Receita Federal que ousou lhe [sic] investigar. E para tanto, iniciou uma série de reações, com ofícios a diversos órgãos, buscando a inversão da lógica, para que o órgão de fiscalização passe a ser fiscalizado.”

A lei tributária não excepcionaliza agentes públicos

A carta aberta dos 195 auditores dizia ainda:

“Não existe qualquer possibilidade de um Auditor-Fiscal indicar um contribuinte para ser fiscalizado, em seleção interna, sem passar por um rigoroso processo de programação (…).

A lei tributária não excepcionaliza agentes públicos, sejam eles ministros, parlamentares ou auditores-fiscais de cumprirem as normas tributárias e estarem sujeitos à análise e eventuais auditorias, que podem ou não resultar em exigência de tributos.”

Poder de blindagem

De fato, o que “excepcionaliza” determinados agentes públicos não é a lei, mas a conveniência de quem tem poder de blindagem. O inquérito das fake news, como já mostrei, foi criado de ofício por Toffoli justamente para isso.

Mais de cinco anos depois de ser impedida de investigar esposas de ministros do STF, portanto, a Receita demonstra novamente seu rigor com os “pequenos contribuintes”.

Outras modalidades de pagamento — como cartão de crédito e depósitos — já eram monitoradas quando os valores excediam 2 mil reais, no caso de pessoa física; e 6 mil reais, no de pessoa jurídica, segundo o órgão. Agora o Pix foi incluído entre as modalidades sob monitoramento, e os valores foram alterados, acendendo o alerta de muitos brasileiros, dada a sanha arrecadatória e controladora do governo Lula, que ainda impõe sigilo sobre os próprios gastos.

Leia também: Vídeo de Nikolas sobre Pix é devastador para Lula

Quando “o montante global movimentado ou o saldo, em cada mês, por tipo de operação financeira, for superior” a 5 mil reais, no caso de pessoas físicas, e 15 mil reais, no de pessoas jurídicas, instituições financeiras, bancos digitais e aplicativos de pagamento ficam obrigados a prestar à Receita “as informações relativas a todos os saldos anuais e aos demais montantes globais movimentados mensalmente, ainda que para estes somatório mensal seja inferior aos referidos limites”.

Os alvos

Segundo a Receita, a medida “melhora a identificação de movimentações que podem estar ligadas a crimes financeiros”. A alegação é a mesma usada em 2018, na Nota Copes 48, para a medida que buscava “aprimorar metodologia de seleção para identificação de indícios de crimes contra a ordem tributária, corrupção e lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores envolvendo agentes públicos”.

Moraes vai suspender, dessa vez, a apuração de eventuais crimes financeiros das pessoas físicas e jurídicas que tiverem suas transações monitoradas com base nos novos critérios?

Para se livrar da devassa caso sua família caia na malha fina, o cidadão comum poderá, como Gilmar, hostilizar a Receita e seus auditores fiscais, além de convocar seu secretário?

Poderá, como Toffoli, abrir inquérito de ofício e entregar sem sorteio a um relator camarada?

Todos sabem as respostas. O tempo mostra apenas, pela enésima vez, que o problema nunca foram os métodos, mas os alvos.

  • Mais lidas
  • Mais comentadas
  • Últimas notícias
1

A pequena cidade paulista que se tornou referência em qualidade de vida

Visualizar notícia
2

Deputados do PL usavam ameaças armadas para extorsão, diz PF

Visualizar notícia
3

Trump revela conversa com Putin sobre guerra na Ucrânia

Visualizar notícia
4

Decisões monocráticas no STF disparam

Visualizar notícia
5

Trump parece um velho assustador, mas é bom ouvinte, diz premiê japonês

Visualizar notícia
6

Senado tem 28 assinaturas para criação da CPI dos Correios

Visualizar notícia
7

Israelenses libertados pelo Hamas sofrem de desnutrição severa

Visualizar notícia
8

Justiça manda excluir vídeo de Barbalho sobre indígenas

Visualizar notícia
9

Lei da barra limpa

Visualizar notícia
10

Israelense libertado não sabia que mulher e filhas estavam mortas

Visualizar notícia
1

Se a gente votar no candidato do Lula, o PT ajuda o Bolsonaro a derrubar a Ficha Limpa?

Visualizar notícia
2

Trump revoga acesso de Biden a informações confidenciais: "Você está demitido"

Visualizar notícia
3

"O que fazemos de bom recai em um silêncio indiferente", diz Barroso

Visualizar notícia
4

STF cobra do governo Lula explicações sobre crise na Terra Yanomami

Visualizar notícia
5

Wellington Dias recua sobre reajuste do Bolsa Família

Visualizar notícia
6

Bolsonaro exalta Hugo Motta e defende anistia a presos do 8/1

Visualizar notícia
7

'Governo prometeu picanha, mas não baixa o preço do café', diz senadora

Visualizar notícia
8

Crusoé: STF fashion gastou R$ 38,4 mil com gravatas personalizadas

Visualizar notícia
9

Casa Civil desmente ministro sobre aumento no Bolsa Família

Visualizar notícia
10

O apoio japonês a Trump contra China e Coreia do Norte

Visualizar notícia
1

Equador vai às urnas em meio a crise econômica e aumento da violência

Visualizar notícia
2

Lei da barra limpa

Visualizar notícia
3

Trump marca presença no Super Bowl

Visualizar notícia
4

Maurício Marcon na Crusoé: Por que o pobre não pode viajar no Brasil?

Visualizar notícia
5

Rodolfo Borges na Crusoé: O cemitério dos vivos ao vivo

Visualizar notícia
6

Josias Teófilo na Crusoé: O resgate da arquitetura clássica

Visualizar notícia
7

Trump revela conversa com Putin sobre guerra na Ucrânia

Visualizar notícia
8

Decisões monocráticas no STF disparam

Visualizar notícia
9

Deputados do PL usavam ameaças armadas para extorsão, diz PF

Visualizar notícia
10

Trump parece um velho assustador, mas é bom ouvinte, diz premiê japonês

Visualizar notícia

Assine nossa newsletter Inscreva-se e receba o conteúdo do O Antagonista em primeira mão!

Tags relacionadas

Alexandre de Moraes PIX Receita Federal
< Notícia Anterior

Na era da IA, "saber perguntar" será mais valioso do que ter respostas

15.01.2025 00:00 4 minutos de leitura
Próxima notícia >

IA de Brad Pitt arranca mais de R$ 5 milhões de francesa

15.01.2025 00:00 4 minutos de leitura
avatar

Felipe Moura Brasil

Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.

Comentários (6)

ALDO FERREIRA DE MORAES ARAUJO

19.01.2025 07:56

A petralhada arrumou um aliado poderoso, o STF, o aparelhamento foi exitoso. E mesmo quem não tinha sido por eles indicado foi devidamente cooptado.


Angelo Sanchez

16.01.2025 13:46

AINDA ESTAMOS AQUI. O STF, o descondenado que nos governa, e toda a turma corruptos da Lava Jato, que estão soltos gritam bem alto "AINDA ESTAMOS AQUI". A nossa Suprema Corte está acima de qualquer Lei e da Constituição, pode soltar bandidos, descondenar corruptos, prender gente honesta e até parlamentares. além de, proibir fiscalização de esposas de Ministros, ou de qualquer outra autoridade.


Claudemir Silvestre

16.01.2025 12:35

Desgoverno da VERGONHA e das IMORALIDADES !!! Fora LULA !! Fora PT !!!


Eduardo Monteiro Moreira César

15.01.2025 16:42

não existe sigilo fiscal e bancário no Brasil


Paulo Pinto

15.01.2025 16:01

Se consideram onipotentes. Difícil sabermos quando e como estes desmandos vão acabar.


eduardo henrique da silva mattos

15.01.2025 15:41

Caramba isso é o fim


Torne-se um assinante para comentar

Notícias relacionadas

Lei da barra limpa

Lei da barra limpa

Rodolfo Borges Visualizar notícia
O fantasma do Mercadante de Sarney

O fantasma do Mercadante de Sarney

Rodolfo Borges Visualizar notícia
Crusoé: O nó górdio da gravata de Barroso

Crusoé: O nó górdio da gravata de Barroso

Duda Teixeira Visualizar notícia
Governo cogitou substituir Uber e iFood por Correios, que podem falir

Governo cogitou substituir Uber e iFood por Correios, que podem falir

Ricardo Kertzman Visualizar notícia
Icone casa

Seja nosso assinante

E tenha acesso exclusivo aos nossos conteúdos

Apoie o jornalismo independente. Assine O Antagonista e a Revista Crusoé.