Não há por que duvidar do estado de saúde de Lula divulgado pelos médicos do Hospital Sírio-Libanês. Ou não havia por quê, até o cardiologista Roberto Kalil (foto), médico do presidente, afirmar, na noite de quarta-feira, 11, que o procedimento pelo qual Lula passou na manhã desta quinta-feira, 12, seria “relativamente simples”.

“Pelo contrário, é um procedimento formalmente definido como de alta complexidade”, refutou o oncologista Bruno Filardi em seu perfil no X.

“Um dos piores inimigos da ciência é a informação propositadamente dúbia ou falsa. Realizado em sala de hemodinâmica. Uma cirurgia. E a doença traz sim risco de algum grau de sequela neurológica”, completou o médico.

Sem especulações

Filardi disse ainda que “não faz sentido especular sobre a saúde do presidente”.

“A chance de um agravo agudo é muito baixa. Ele deve se recuperar bem. Algo diferente disso seria uma surpresa. Em relação a uma possível sequela neurológica leve, o risco não é desprezível, mas continua pouco provável”, finalizou.

O cirurgião vascular Seleno Glauber entrou na conversa, com um extenso detalhamento sobre o procedimento a que Lula foi submetido, e questionou: “Já deu pra perceber que não é nada muito simples, né?”.

O médico já tinha comentado o seguinte, a partir da entrevista de Kalil:

“Relativamente simples uma pinoia. Você precisa acessar a artéria femoral, subir um cateter até a carótida externa (artéria no pescoço), passar um outro cateter mais fino ainda e realizar a seletivação da artéria meningea média. Depois de tudo isso, precisa injetar um agente embolizante líquido e fechar a irrigação do vaso. Risco de dissecção do vaso, espasmo, embolização de ramos não-alvo, falha do tratamento etc etc.”

E Alckmin?

Filardi e Glauber concordam que Lula não estaria apto a seguir na presidência neste momento, mas o fato é que, mesmo internado em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI), o petista não passou o bastão para o vice-presidente Geraldo Alckmin.

Questionado, em entrevista coletiva, se Lula tinha assinado duas portarias que constam no Diário Oficial, Kalil disse que não sabia dizer, mas afirmou que o presidente teria condições físicas para fazê-lo, apesar de os médicos recomendarem repouso.

Kalil também foi questionado se Lula passou por sedação. Ele confirmou que sim, mas negou a aplicação de anestesia geral para o procedimento desta quinta.

A posição do médico do presidente é difícil, obviamente. Ele não pode alarmar a população além do necessário, mas também não pode soar como alguém que minimiza o quadro do presidente.

79 anos

Esse é um cálculo é muito difícil nas atuais condições de Lula, mesmo sem considerar os procedimentos pelos quais o petista teve de passar desde terça-feira.

Lula foi eleito para um terceiro mandato com 77 anos e, ao completar 79, se tornou o presidente mais velho da história do Brasil.

O tombo que levou no banheiro em outubro deixou claro que seu estado de saúde é exatamente o que se espera para um homem de 79 anos, ao contrário do que ele tenta projetar ao dizer que tem “energia de 30 e tesão de 20 anos” e ao aparecer em fotos praticando exercício físico.

Procedimento programado?

Só essa tentativa de projetar um vigor que já não existe explicaria por que a equipe médica pensou que seria uma boa ideia omitir que Lula passaria por um novo procedimento nesta quinta-feira, depois de ter passado por cirurgia de emergência na madrugada de terça.

“Nós íamos divulgar para vocês, porque isso não é esconder informação, na coletiva que está marcada para amanhã às 10h. Porém, o presidente e a dona Janja fizeram questão de botar no boletim antes do procedimento, que é uma rotina”, comentou Kalil ao explicar o procedimento na noite de quarta, dizendo que a intervenção realizada nesta quinta estava prevista desde a cirurgia de terça.

Na tarde desta quinta, Kalil informou que Lula passará por um terceiro procedimento, às 19h, para retirar um dreno do cérebro. Segundo ele, esse era outro procedimento programado. Então, a pergunta se impõe mais uma vez: por que não foi avisado antes?

A sombra de Biden

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, negou, em entrevista publicada por O Globo na segunda-feira, que a idade poderia ser um empecilho para a tentativa de reeleição de Lula, e rejeitou comparações com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, que teve de abandonar a disputa com Donald Trump no meio do caminho por questões de saúde.

O ministro da Secom, Paulo Pimenta, reforçou nesta quinta que o candidato do PT nas próximas eleições presidenciais é Lula, mas não é mais possível negar as semelhanças com Biden — para cujas limitações provenientes da idade muita gente tentou fechar os olhos.

Lula terá 81 anos em 2026, a mesma idade que o democrata tinha quando foi forçado a admitir que não reunia mais condições físicas e mentais para disputar a presidência dos EUA.

Quem participar da tentativa de negar as limitações físicas de Lula, por mais brandas que possam ser, corre o risco de se desmoralizar.

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