Duda e Erika deixarão de ser mulheres por causa de Trump?
O padrão de boa parte daqueles que se apresentam como defensores de minorias é atacar e não admitir pensamentos divergentes

Pepeka, Xibiu, Prikito, Perseguida, Xana, Perereca… Bráulio, Bilau, Pinto, Pipico, Piupiu, Taco… Certa vez, eu e um amigo espanhol, em Barcelona, após tragos e mais tragos acompanhados de tapas fenomenais, ambos “mais pra lá do que pra cá” – ele bem mais do que eu, diga-se – começamos, como adolescentes no recreio, a brincar com os sinônimos das genitálias humanas, também conhecidas como Pênis e Vagina, não necessariamente apenas isso e nessa ordem.
Entre gargalhadas e explicações sem nexo do porquê dos nomes, como se fosse possível entender o que nossas línguas e criatividades pensaram quando criaram, sei lá, Benga ou Chibata, discorríamos também sobre as diferenças banais entre homens e mulheres, como fazer xixi em pé ou sentada; usar papel higiênico ou ducha higiênica; dormir com ou sem cueca ou calcinha, e outras coisas de “suma importância” para dois boêmios ébrios que não se encontravam há alguns anos.
O meu amigo tem um irmão homossexual. São como unha e carne. Fanáticos pelo Espanhol – aliás, o que diabos faz uma pessoa ser de Barcelona e não torcer justamente pelo Barça, mas pelo Espanhol? -, amantes da noite, colecionadores de discos de vinil, verdadeiras almas gêmeas. Seus pais, catalães das antigas, jamais conviveram bem com a situação, o que levou o rapaz a se mudar de casa ainda com 16 para 17 anos, trazendo enorme desconforto para ambos os irmãos.
Respeito, sim
À época, casado há alguns anos com um italiano, começavam a tatear o assunto adoção, ou mesmo uma “barriga de aluguel”. Sempre fui, particularmente, apoiador da união civil entre pessoas do mesmo gênero e também da possibilidade de adoção. Tenho amigos fraternos, de décadas, que são homossexuais. Tenho parceiros comerciais com filhos e filhas homossexuais. Convivo intimamente com casais do mesmo sexo. Para mim, jamais houve – ou há – qualquer diferença entre os tais e outros, heterossexuais.
Manifestações públicas minhas em rádios, portais, jornais e revistas no sentido do combate veemente e incondicional ao preconceito – seja de gênero ou qualquer outro – há aos montes. Até porque sou judeu. Assim, me sinto bastante confortável para me manifestar sobre os casos das deputadas federais Erika Hilton e Duda Salabert, que tiveram seus gêneros alterados pelo sistema de visto de entrada americano, por determinação da atual administração Donald Trump, sem receio de “cancelamento”.
Não só considero legítimo o presidente de turno de um país, desde que em acordo com as leis locais, considerar o sexo biológico como detrminante para a qualificação legal da pessoa, como entendo correto. Jamais vi sentido – atenção: estritamente sob o aspecto legal – na alteração de um “ato jurídico perfeito”, qual seja, a emissão de uma certidão de nascimento, porque o indivíduo (adulto), com todo o direito e respeito que sua personalidade merece, não mais assim se identifica.
Mas respeito com todos
A adoção do nome social e, mais ainda, do gênero que se pretende, não apenas deve ser respeitado como merece jamais ser questionado por alguém, já que de foro íntimo e sem qualquer repercussão a terceiros. Erika e Duda são mulheres, sim, senhores! E como tais devem ser admitidas e respeitadas socialmente. Porém, sob o aspecto natural – e legal -, para alguns países, são homens. A partir daí, alegar preconceito ou transfobia, como vêm fazendo em relação a Donald Trump, é, a meu ver, o tradicional proselitismo ideológico.
Além do mais, nunca é tarde para lembrar, se Trump é preconceituoso e transfóbico – e ele é, mas não estamos falando do bufão alaranjado, e sim do presidente americano e da lei daquele país -, então ao menos cinco juízes da Suprema Corte do Reino Unido também são, já que acabaram de decidir no mesmo sentido. Adjetivar – e atacar – aqueles que pensam de forma oposta, não socorre da melhor forma as deputadas que se sentem ofendidas. Ao contrário. Torna-as aquilo de que acusam seus alvos: intolerantes.
Outro ponto importante a lembrar é o costumeiro alinhamento da esquerda brasileira a ditadores e ditaduras mundo afora, que sempre sonegaram direitos mínimos às pessoas LGBTQIA+, chegando ao cúmulo, em alguns regimes, de prisão ou mesmo condenação à morte. E só toco neste fato porque entendo que Duda e Erika, mais que manifestar os próprios e legítimos sentimentos, aproveitam o momento para aparecerem politicamente. Do contrário, eu não misturaria as coisas
Voltando aos nomes
Iniciei este texto lembrando da noite divertidíssima com meu amigo, porque nomes, ainda que apelidos e brincadeiras, importam. Neste sentido, os nomes de Duda e Erika continuam preservados e respeitados pelo governo americano. A repercussão de suas escolhas, neste aspecto, não produz efeitos legais que, por qualquer motivo, invadam a esfera de terceiros. Ou seja, a identidade de ambas, como indivíduos, permanece, e isso é o que verdadeiramente conta.
O padrão de boa parte daqueles que se apresentam como defensores de minorias é atacar e não admitir pensamentos divergentes, sob a alegação de perseguição, preconceito, intolerância etc. Em muitas oportunidades isso ocorre mesmo. Porém, em muitas outras, não. Querer, neste caso, imputar transfobia a Trump e se vitimizar, como se fosse uma medida personalíssima, não só é falso como, mais uma vez, é contraproducente.
Duda e Erika poderiam simplesmente divulgar o episódio, mostrar contrariedade e seguir a vida. Mas não. Preferiram o confronto. Com isso, garantem a exposição necessária em suas bolhas, mas não ultrapassam as fronteiras que precisam, para levar – e elevar – o debate adiante. Ou seja, acabam trabalhando apenas para si mesmas, e não pela causa que juram defender, o que, diga-se, não chega a ser surpresa para ninguém.
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Comentários (6)
Marcia Elizabeth Brunetti
21.04.2025 09:12Aqui surgem diversas opiniões sobre o artigo do Ricardo Kertzman, mas acho que todos aqui concordam que bastou falar que é contra os pensamentos das "minorias" LGBTQIA+ para ser taxado, atualmente, de extrema direita. Eu não estou nessa bolha mas sinto que a bolha de esquerda tem conseguido se afastar cada vez mais do objetivo que os levou inicialmente a lutar por igualdade. Isso também vale para pretos, pardos , até quem não é se identifica como. Então me pergunto se um indivíduo que se identifica como negro, mas é branco, deve brigar com as autoridades que emitem passaporte, por exemplo?
FRANCISCO JUNIOR
20.04.2025 22:05Eu que costumo concordar com o Ricardo Kertzman fiquei bastante decepcionado com o texto. Trump fez o que fez por birra somente. Veja no próprio link que mandou que a alteração de feminino para masculino se baseou apenas no conhecimento público de que as deputadas são trans. O visto tem que ser dado pela documentação apresentada e fim de papo. E aí veio a outra bobagem do costumeiro alinhamento da esquerda a ditadores e ditaduras, o que em si é verdade mas é também da direita - vide o próprio Trump, Bolsonaro, Orban, etc. . O problema não é ser de direita ou esquerda, é ser de extrema direita ou extrema esquerda. Nos dois casos também há perseguição contra LGBTQ.... .
Joao Paulo Da Mata PatrÃcio
20.04.2025 10:34Hoje cada um é o que quer ser. Uns querem ser gatos , outros cachorros , eu mesmo gostaria de ser girafa. Só não me obriguem a chamar um humano de cachorro, ou chamar um humano que tem cara de homem, voz de homem, não tem vagina de mulher, de mulher. As mulheres têm que se revoltar. !!
Amaury G Feitosa
19.04.2025 08:56Gênero é masculino e feminino e boga não faz neném ... infelizmente nada pode mudar isto mas a esquizofrenia "diferente" ainda não aprendeu a se dar ao respeito, a respeitar os outros e amar independente de condições pois muitas mentes torpes só se prestam ao ódio aos que nenhuma culpa tem de suas diferenças que repito devem ser entendidas, aceitas e amadas.
Fabio B
18.04.2025 13:00Nunca serão.
Daniela_RS
18.04.2025 12:36Minha única ressalva é que sempre que alguém precisa de um qualificativo, é porque não se enquadra na inteira definição do substantivo. Com isso quero dizer que "mulher trans" não é sinônimo de "mulher", assim como "homem trans" não é sinônimo de "homem". Trans é alguém que nasceu com um sexo biológico e não se identifica com ele, tendo ou não feito uma cirurgia e/ou tratamento hormonal para se diferenciar fisicamente do seu sexo biológico. Mas isso nunca fará uma pessoa trans inteiramente idêntica, física e psicologicamente, a uma pessoa que não é trans e que, portanto, não precisa de qualificativo para se identificar, porque é home ou mulher