Caso Musk: como a antipatia leva à demonização

17.02.2025

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O Antagonista

Caso Musk: como a antipatia leva à demonização

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Felipe Moura Brasil
6 minutos de leitura 23.01.2025 16:11 comentários
Análise

Caso Musk: como a antipatia leva à demonização

Uma análise da passionalidade no debate público

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Felipe Moura Brasil
6 minutos de leitura 23.01.2025 16:11 comentários 6
Caso Musk: como a antipatia leva à demonização
Foto: Reprodução/ X

Quando pessoas passionais não simpatizam com um indivíduo, cai assustadoramente o nível de exigência delas em relação às evidências necessárias para a conclusão de que ele fez algo repugnante ou maligno, de modo consciente, intencional e deliberado.

Não simpatizar com um indivíduo também aumenta exponencialmente a suscetibilidade das pessoas passionais à manipulação feita por propagandistas políticos cínicos, para que elas repercutam suas ofensas a adversários, como se fossem descrições de fatos objetivos.

Nesses casos, as pessoas passionais funcionam como um cônjuge que, atormentado com a hipótese de traição, vê em qualquer cumprimento de terceiros uma prova do ato consumado, sobretudo se manipuladores estiverem espalhando fofocas neste sentido.

Leia também: Musk nazista? O duplo padrão moral da esquerda ataca outra vez 

O gesto de Elon Musk

Um exemplo ilustrativo deste fenômeno veio do gesto de Elon Musk (à direita na foto), na posse de Donald Trump (à esquerda na foto) como presidente pela segunda vez dos Estados Unidos, que levou a esquerda e seus porta-vozes a associarem o empresário ao nazismo.

O dono da rede social X e agora chefe do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE, na sigla em inglês) do governo Trump, ao discursar empolgado para uma plateia de eleitores republicanos, declarou do palanque:

“Eu só quero dizer obrigado por tornarem isso realidade, obrigado.”

Ovacionado, Musk imediatamente colocou a mão no peito e fez um gesto rápido de lançamento do coração para a plateia, dizendo com todas as letras em seguida: “My heart goes out to you”, o que, literalmente, significa: “Meu coração sai [do meu corpo] para vocês”.

Saudação nazista?

Na imprensa amiga da esquerda, porém, o braço esticado por um segundo, com a mão espalmada, foi interpretado como uma saudação nazista, alegação turbinada com a edição do vídeo, ou o congelamento da imagem do gesto, de modo a omitir a frase que o explicou em tempo real, com sentido próprio.

Que alguém com quem não se simpatiza — e que sofra da Síndrome de Asperger — tenha feito um gesto espontâneo e eventualmente desengonçado que apenas se assemelha involuntária e parcialmente (ou as tropas de Hitler botavam a mão no peito?) ao símbolo de um regime que matou 6 milhões de judeus, é uma possibilidade vista por pessoas politicamente passionais como “ingenuidade” ou “erro”, e por manipuladores como defesa de “nazistas”.

Essa gente já definiu que Musk é mau e não quer abrir mão da chance de explorar o episódio para legitimar sua tese pré-concebida. A oportunidade de carimbar como abominável o indivíduo com quem não se simpatiza, de modo a persuadir os outros de que ele não merece credibilidade em seus posicionamentos e opiniões, é por demais tentadora para manipuladores e pessoas passionais, e acaba prevalecendo à necessidade de embasar, com elementos de corroboração, a pior interpretação possível, tomada como verdade incontestável.

Qual é a evidência?

A hipótese-mãe de que Musk é nazista ainda se desdobra, no entanto, nas hipóteses secundárias de que Musk tenha feito o gesto com a intenção maquiavélica de afagar uma suposta parcela de eleitores simpáticos ao nazismo, ou de despertar uma reação midiática hostil a fim de apontar a própria histeria esquerdista. Mas qual é a evidência da necessidade de usar estratégia tão arriscada — capaz de gerar desgaste em outros segmentos e desviar o foco das primeiras medidas do governo Trump — após a vitória eleitoral?

Nenhuma, claro. Tampouco há evidência de qualquer ato antissemita, ou estímulo ao ódio contra judeus, praticado por Musk, o que não se pode dizer da esquerda anti-Israel e de seu braço midiático, que vêm repercutindo em TV, rádio, campi universitários e redes sociais as narrativas falseadas do Hamas sobre o 7 de outubro de 2023 e a reação militar israelense.

Pelo contrário: em novembro de 2023, mês seguinte ao assassinato de mais de 1200 pessoas e ao sequestro de outras centenas, Musk mostrou em painel da Cúpula DealBook, evento do jornal americano New York Times, que usava um colar pró-judeus com os dizeres “Tragam-nos de volta”, em referência aos reféns levados para a Faixa de Gaza, e ainda repudiou os atos no Ocidente de apoio ao terror.

Reféns do Hamas

“Ganhei [o colar] dos pais de um dos reféns. Prometi usar enquanto houvesse reféns. E tenho usado. Os judeus têm sido perseguidos há milênios. Todo mundo aqui viu as manifestações pró-Hamas em todas as principais cidades ocidentais. Isso deveria ser chocante”, disse o empresário na ocasião.

Em que pese o interesse do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, de acenar ao governo Trump, não é de surpreender, portanto, que ele tenha saído agora em defesa de Musk como “um grande amigo de Israel”, que “está sendo falsamente difamado”.

“Ele visitou Israel após o massacre de 7 de outubro, no qual terroristas do Hamas cometeram a pior atrocidade contra o povo judeu desde o Holocausto. Desde então, ele tem apoiado repetida e vigorosamente o direito de Israel de se defender contra terroristas genocidas e regimes que buscam aniquilar o único Estado judeu. Agradeço a ele por isso”, registrou Netanyahu no X.

Prudência

Uma das diferenças entre pessoas passionais e jornalistas sérios, ou qualquer cidadão indisposto a deixar-se levar por seus instintos mais primitivos, é a prudência de reprimir ou recusar interpretações feitas com o fígado a partir das aparências, ou da exploração maliciosa delas, sobretudo para não ofender a honra de qualquer indivíduo gratuitamente, com base em especulações sobre intenções ocultas.

Associar alguém aos atos mais cruéis da história humana, a partir de uma base tão rasteira, não só banaliza a crueldade histórica, como vulgariza o debate público. Da divergência à antipatia, da antipatia à hostilidade, da hostilidade à ofensa, da ofensa à demonização, da demonização à violência, da violência à guerra, o caminho é cada vez mais curto.

O cinismo de manipuladores pode não ter cura, o que dificulta a reversão desse processo, mas a passionalidade de pessoas comuns, se conscientizada, pode ser contida antes da selvageria. Urge que subam o nível de exigência de evidências para acusações tão infames.

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Felipe Moura Brasil

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Comentários (6)

FRANCISCO JUNIOR

26.01.2025 22:06

Felipe, concordo com o que você falou. Aqui os adoradores do Lula demonizam quaisquer atos do Bolsonaro, e vice versa. Mas eu acho que você esqueceu uma coisa na sua análise: Musk perdeu uma ótima oportunidade de dizer que ele abomina o nazismo - ele não fez isso, e isso alimentou todas as centenas de memes contra ele. Teria tido custo zero para ele, e extremamente positivo para a humanidade, se ele tivesse esclarecido o que ele acha do nazismo após esse episódio.


Luiz Filho

24.01.2025 13:34

A velha tática da esquerda de acusar os outros do que fazem


Alcides Niceas Pires

24.01.2025 12:14

Felipe Moura Brasil é um exemplo de inteligência, cultura, correção profissional e busca de imparcialidade. Infelizmente, esses requisitos têm ficado raros de ver juntos na nossa imprensa. Obrigado, FMB.


Alexandre Ataliba Do Couto Resende

23.01.2025 18:59

Quem acusa hoje em dia as pessoas de "nazistas" por situações cotidianas e descontextualizadas contam com a grande ignorância alheia sobre o que foi o nazismo. Qualquer pessoa com um mínimo conhecimento de história sabe que tal conversa é uma rematada bobagem. Como Madeleine diz: enquanto existir otario malandro não passa fome.


Luis Eduardo Rezende Caracik

23.01.2025 18:34

Felipe, não só no Brasil, mas no mundo todo, Musk é visto com muita reserva por diversos motivos evidentes e outros nem tanto. Sendo quem é, sabendo onde estava, deveria ser um pouco mais consciente sobre a forma de seu gesto. Mas deixando o gesto de lado, a antipatia e as reservas são fruto de observação ao longo de muito tempo, de minha parte pelo menos, por razões bem objetivas que não cabe enumerar aqui. Querer dizer que é cinismo imaginar que o gesto pareceu a saudação nazista, e que chamou a atenção inclusive de boa parte da imprensa séria internacional é um baita erro. Se foi com intenções nazistas, e outra história. Mas que pareceu, e muito, com uma saudação nazista, pareceu.


saul simoes junior

23.01.2025 16:49

Quanta bobagem!


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